Renato Varela de Oliveira (ao centro) fortaleceu laços com os parentes após o episódio que transformou sua vida Foto: Charles Dias
O tempo parece não ter passado para Renato Varela de Oliveira um ano após o acidente em que esteve à beira da morte na BR-376, próximo ao município de Jaguariaíva.
O caminhoneiro de São Sebastião do Caí, Rio Grande do Sul, ainda conserva as marcas do episódio — duas cicatrizes na perna e no pé – e a lembrança dolorosa das 116 horas que pareceram não ter fim. Mas teve forças para tirar uma lição dos dias de terror e mudar de vida.
Da fria madrugada de 3 de junho do ano passado à noite de 7 de junho, quando o resgate chegou, Oliveira sobreviveu graças às laranjas da carga que levaria de Itararé (SP) a Harmonia . Foram cinco dias de medo e angústia.
À época com 43 anos, Oliveira conservava hábitos pouco recomendáveis para quem dirige cargas com alto valor e por longas distâncias. Conta que chegava a dirigir por 17 horas seguidas e confessa que, algumas vezes, fazia uso do popular “rebite” – medicamento à base de anfetamina, inibidor de sono – para manter-se acordado por horas a fio.
Em seu semanal trajeto de 1.006 km entre São Sebastião do Caí e Avaré (SP), as paradas para descanso eram uma ou, às vezes, nenhuma. Geralmente estacionava o caminhão, saía para tomar um café e comer um pastel e já voltava para o veículo para continuar a viagem.
Além da jornada exaustiva, Oliveira conta que sempre ultrapassava o limite de carga suportado por sua Scania. Na viagem que culminou no acidente, quando caiu em um barranco de cerca de 20 metros de altura, o caminhão transportava 17 toneladas de laranjas, duas além do limite permitido pela montadora do veículo.
Hoje, os hábitos perigosos que o conduziram a 116 horas de terror e reflexão levaram-no a ficar mais próximo à família e da fé católica.
— Mudei tudo nesse ano que passou. Agora, transporto combustível também para São Paulo, mas descanso muito mais e não viajo mais do que seis horas seguidas sem parar. Também não largo dos amigos, da família e do meu contato com Deus. Todos os dias pela manhã, agradeço por poder abraçar meu filho mais uma vez — diz Oliveira, hoje com 44 anos e morando com os pais, a irmã e uma sobrinha em uma casa de madeira em São Sebastião do Caí.
As lembranças das 116 horas à espera do resgate
Imagem do momento do resgate, no ano passado - Foto: Polícia Militar Rodoviária do Paraná/Divulgação
As laranjas mudaram a vida do caminhoneiro Renato Varela de Oliveira, mas não a sua relação com elas. Ele ainda aprecia a fruta e a degusta sempre que possível. A mãe não poupa elogios ao filho do meio – o caminhoneiro tem dois irmãos e duas irmãs.
— Não largo mais ele para nada. Todos os dias, ligo para saber se está tudo bem. Achei que ele não iria aguentar. Foi um milagre de Deus — diz, às lágrimas, sem poder continuar a conversa, a aposentada Maria Terezinha Varela, 68 anos.
As lembranças dos dias de terror e agonia vividos há um ano por Oliveira teimam em voltar. Da madrugada de domingo, 3 de junho de 2012, quando o motorista cochilou ao volante, após sair do município de Itararé (SP), e o caminhão seguiu ribanceira abaixo e tombou, com o lado do motorista para baixo, até a noite de quinta-feira, 7 de junho, quando o resgate chegou, Oliveira sobreviveu graças à fé e à esperança de reencontrar os pais, os irmãos e o filho de sete anos.
Ele reconhece, porém, que o fator primordial que o manteve vivo foi comer as laranjas que transportava para o Rio Grande do Sul. O carregamento, avaliado em R$ 15 mil, caiu da caçamba em direção a cabine com o impacto do acidente, e o deixou lúcido nos primeiros dias do drama provocado pelo acidente.
— As minhas pernas estavam presas pela lataria do caminhão. Nos primeiros três dias, comi e bebi o suco delas para saciar a sede. Foi o que me manteve saudável, apesar dos machucados — lembra.
Fé em Deus para suportar o drama
O frio e as constantes chuvas naquela região nesta época do ano, no entanto, deixaram-no próximo à morte. Na terça-feira, dia 5, um temporal alagou a cabine do caminhão. A água subiu até o pescoço de Oliveira, já que o veículo estava tombado próximo a um bueiro de um arroio. Quando a chuva cessou, a gripe e a febre chegaram para avisá-lo de que a morte poderia estar próxima.— A minha garganta fechou. Eu não conseguia mais comer ou beber. A minha roupa estava toda molhada. Passei os últimos dois dias desmaiando e acordando. Cheguei a imaginar o meu velório. Apelei para Deus e só pensava na minha família — emociona-se Oliveira ao recordar da luta para manter-se vivo.
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